quinta-feira, 13 de dezembro de 2007

Idiotas e TV a Cabo

Qual é o problema com as pessoas? Sério, o que está acontecendo? Vejo um monte de gente falando no meio onde eu trabalho: “O cinema nacional precisa de mais incentivos, o audiovisual precisa cair no gosto do povo” e blábláblá. Como sempre esse tipo de frase é igual teoria sobre como a seleção brasileira deveria jogar, até a tia Cotinha tem uma idéia.

Qualquer imbecil formula uma idéia sobre porque o audiovisual nacional não cai no gosto do povo. E como, pra resolver esse problema, deveriam ser criados mecanismos específicos. A lei Rouanet e a Lei do Audiovisual já são malhadas até não poder mais. É claro que elas não são perfeitas, aqui no Brasil nada é. Mas, poxa, é um começo. Não precisa ser nenhum perito pra olhar para trás, nos últimos quinze anos, e ver o tanto que a produção audiovisual aumentou. Se o conteúdo em geral é bom é uma outra questão. Eu pelo menos sou do tipo de opinião que é dando a cara a tapa que se aprende a fazer, então, o natural é que quando a coisa está engatinhando os resultados não sejam os melhores. O problema é que tem sempre os idiotas do tipo: “Não assisto filme nacional nem fudendo!”. Problema seu tiozão (são sempre tiozões). Tem também o tipo que sempre compara os seriados nacionais, super escassos, com os americanos.

Nessas horas eu me pergunto: “Será que esse imbecil já esteve próximo de um orçamento de um filme ou seriado?”. Porque eu já. E mais, será que essas pessoas já pararam pra pensar na dificuldade que é pra tentar vender um seriado pra um canal por assinatura? Porque funciona mais ou menos assim meus amigos: um seriado como Friends, digamos, tem um orçamento de 10 milhões por episódio (deve ser até mais, estou chutando). A grana é alta porque os cachês dos atores são imensos, no caso de atores que são famosos, como esses eram. Além do marketing, salários de produtores, roteiristas, equipe técnica, etc.

Uma emissora americana financia numa boa esse orçamento. Se for um seriado de sucesso vai render uma nota preta com anunciantes, patrocinadores, produtos licenciados, vendas de DVD, etc. Aí, vem um canal como a Warner, que só retransmite o que os canais como a ABC produzem, e compra uma temporada de Friends para exibir e reprisar na América Latina ad infinitum.

E você acha que ela compra pelos mesmos 10 milhões o episódio? Nunquinha, é que agora que o seriado está pago pelas rendas com anunciantes, patrocinadores e o diabo a quatro, a ABC vai querer vender mais barato pra conseguir dar mais saída pro produto. Assim, vários canais compram as temporadas, bem mais barato, já que ela está saindo da Finlândia até o Marrocos. Até a Record exibiu Friends (foi a Record?), e vocês não acham que ela pagou 10 milhões por episódio, com uma temporada de 22 episódios cada, né?

Agora chegamos na questão que eu queria: há alguns dias veicula na TV a cabo uma propaganda insistente para que o projeto de lei nº 29 de 2007 não seja aprovado. A propaganda é veiculada pela ABTA, Associação Brasileira de Televisão por Assinatura. O mote da campanha é a preservação do seu direito de escolha, já que o projeto de lei em questão visa a obrigatoriedade de uma cota de programas nacionais em canais estrangeiros. A cota é de 10% em canais estrangeiros, sendo que 50% dos canais dos pacotes tem que ser nacionais.

A ABTA diz que isso é um abuso e que vai tolher nosso direito de escolha. Como assim? De repente eu vejo que tem um canal chamado “TV Frevo” no meu pacote e aí vou ser obrigado a assisti-lo? Eu não sei se a ABTA sabe, mas, no meu pacote da SKY tem um monte de porcarias que eu nunca assisti, não necessariamente nacionais. Acredito que 70% do meu pacote da Sky não tem nada que eu assista. Pergunta se eu tenho a ‘liberdade’ de me livrar desses canais para enxugar meu pacote? Claro que não.

O que me assusta é como as pessoas são idiotas. A campanha da ABTA é tão somente para privá-la de comprar material nacional, que não é revendido e sim produzido. Ou seja, ela não vai mais poder comprar seriados reprisados dos EUA a preço de banana, em troca ela vai ter que comprar de produtoras nacionais, saindo muito mais caro pra ela. Agora, se vai sair mais caro pra ela eu não sei, e, francamente, não é problema meu. Tem, é lógico, aquela desculpinha sempre “ah, mas aí eles vão acabar aumentando o valor dos pacotes”. E é lógico que eles vão fazer isso, sempre que aumenta o custo esse aumento é repassado para os consumidores. Mas isso não é desculpa, você não pode impedir que a produção do audiovisual avance só pra poder preservar o balanço de algumas empresas, isso é uma lógica destorcida. Se aumentou meu filho, ou você cancela ou negocia com sua fornecedora de TV por assinatura.

Além do mais, 10% da programação dá 2 horas e 24 minutos! Se fosse programação contínua, e não é, tem comerciais. Sendo assim, as emissoras vão ter que investir em duas horas diárias de programação nacional. Se ela comprar um pacote de animações em flash feitas pelo estúdio Zé das Couves, pra exibir as três da matina, quanto você acha que isso vai custar? E não me venha com esse papinho de que a qualidade vai cair. Você já viu a qualidade das legendas do seu canal por assinatura ultimamente? A qualidade dos comerciais e das vinhetas? Já viu, pra resumir, a qualidade da Fox? Estou falando isso só pra mostrar que qualidade não é exatamente o topo da lista de prioridades da TV a Cabo.

E além do mais, as pessoas já vão fazendo previsões como se os produtos nacionais que as emissores serão obrigadas a comprar sejam novelas e outras porcarias nacionais. Depois eu é que sou antipatriota, os idiotas acham que só se produz merda por aqui e fica por isso mesmo. Como eu trabalho numa empresa de animação eu sei, por experiência própria, que idéias nós temos aos montes. E das boas. Só precisamos de espaço e chances iguais, sem precisar competir com um canal que compra séries de animação no quilo, de empresas americanas que, por sua vez, terceirizam animação em países como a China ou Índia, por 0,08 centavos o minuto.

Só sei que é no mínimo uma falácia, essa campanha da ABTA. E tem um monte de gente que apóia, em dois blogs que eu considero muito, por exemplo, houve manifestações de apoio. Num deles, especializado em cinema, fala-se muito em cinema nacional e quais as soluções para nosso audiovisual. E quando aparece uma lei pra começar a ajudar, eles criticam, porque vão deixar de ‘escolher’ o que assistir. Eles estão precisando me dar o telefone da operadora de TV a Cabo deles, porque, na minha, eu não consigo escolher nada neste momento. É mais uma prova de que o marketing funciona mesmo, ainda que seja imbecil. É prova também que as pessoas acreditam em tudo que assistem na TV. Talvez as TVs estejam certas, ninguém vai ter escolha mesmo, elas já não tem agora, ninguém pensa mais se não tiver uma campanha de marketing pra ajudar.

A campanha da ABTA.

Uma opinião brilhante, na minha opinião, sobre o assunto.

4 comentários:

Ereke disse...

Eu nao sei nao... Nao gosto desse trem de ficar regulando o mercado por puro patriotismo, achando que o Brasil tem que produzir as coisas... Se eh mais barato produzir la fora, que nos danemos... Assim eh o capitalismo, ou assim deveria ser. Libera tudo! Eu nao sei se eu tenho coragem de ser tao liberal quanto eu acho que deveria ser, mas para mim eh o mais certo... ou nao. Deviamos ser cidadaos do mundo e nao do Brasil... o foda eh que 99% do mundo nao pensa assim... desencana galera, quero ver o dia em que os ETs chegarem para dominar a Terra! Aposto que vai todo mundo se unir, as fronteiras vao acabar e tal! O inimigo comum nos unirah em nossos coracoes! Aleluia! Ave Capitalismo! Ave Cosmopolitanismo! Ave globalização! Ave Universalização! Aleluia irmão!

Daniell disse...

É, mas desse jeito as pessoas não tem chance de mostrar seu trabalho né? Vamos supor que você nasça um gênio, um gênio do audiovisual. Vamos supor que a TV vai ser outra depois da sua aparição. Como diabos isso vai acontecer, se as emissoras de TV continuam a comprar as mesmas merdas de sempre só porque é mais barato? Além do mais, reserva de mercado para o audiovisual só não é praticada aqui e no México, TODOS os países desenvolvidos ou em desenvolvimento tem.

The unknown human who sold the world disse...

Eu gargalhei nessa campanha....

principalmente pq ela passou na minha "gato net" rs rs rs


Acho que o grande problema do audiovisual brasileiro jaz no fato de nao termos roteiristas suficientes, não valorizados. Uma idéia é tudo, independente de grana.

Anônimo disse...

Acredito que o que vem faltando a produção audiovisual não seja falta de patrocinio ou idéias, mas sim, apoio à produção nacional. Nos últimos meses, vários filmes nacionais estreiaram nos cinemas. E bons filmes. Agora, eu pergunto, quantos preferiram ver um filme americano a um brasileiro. Os últimos que assiti, como sempre estavam cheios de logos dos patrocinadores, mas as sessões nem tão cheias, como quando fui assistir uma porcaria americana que nem lembro o nome.
Talvez com uma cota de 10% na programação sendo nacional, passemos a dar valor ao que tem sido feito pelo país.