Essa semana recebemos na escola Carlos Reygadas, um cineasta mexicano que tem certo reconhecimento internacional com seus filmes, estritamente filmes de arte. Confesso que ainda não vi nenhum dos filmes de Reygadas, mas o sujeito parece gente boníssima. É nesses momentos que você ama a escola, porque em que outra escola do mundo os alunos poderiam tomar cerveja com um artista conhecido, que pode passar muitos dos seus conhecimentos para eles? Em outra parte do mundo você almoça com um diretor de cinema de prestígio internacional? E que pega fila no refeitório como todo mundo!
O outro ponto alto da semana é que a parte prática do curso voltou, depois do hiato de algumas semanas de teoria. Se bem que eu não considero o taller de três semanas de roteiro como só teórico, afinal, tivemos que escrever muita coisa e para mim não resta dúvida de que isso é prática. Mas a parte bizarra ainda está por vir.
Pense numa mídia visual que sumiu, que está totalmente extinta mesmo. Completamente. Talvez reapareça vez por outra apenas como um tipo referência ao passado ou como uma forma didática, sem fins artísticos. Pensou? Pensou em fotonovela? Se pensou nisso acertou, agora tenta adivinhar quem está tendo um taller prático de fotonovela? Se pensou
Quando eu vi escrito no quadro geral, que mostra todos os talleres que teremos até o fim do ano letivo, imaginei, no mínimo, que essa forma de... de 'arte', estivesse em uso em alguma parte da América Latina. Mas não, está extinta mesmo, assegurou meu professor uruguaio – que além de ser professor dessa pérola tem a irritante característica de falar baixo como um monge Zen budista. E depois de fazer minhas sinapses trabalharem em hora extra por um momento, cheguei a conclusão de que o objetivo do taller era, obviamente, exercitar a narração de uma história de maneira visual. E que sim, era um bom exercício pensar numa história de forma visual, decupar uma fotonovela, pensar em planos, etc. Além da aula de fotografia e revelação fotográfica que tivemos, que foi muito boa. Mas algum de vocês, caros leitores, já leu uma fotonovela? É horrível! Eu aconselho que se não leram não leiam nunca, preservem sua inocência e dignidade.
E o pior é que o professor faz questao que nosso exercício se enquadre dentro da 'linguagem' (leia-se clichê) de uma fotonovela. O pior é que em qualquer uma dessas pérolas as fotos em si são praticamente dispensáveis. A descrição emocional e psíquica dos personagens que cada um dos quadros leva é tão completa e transparente que torna as imagens supérfluas. Além do fato de que as imagens são tão genéricas que podem contemplar quase qualquer descrição. Eu entenderia o exercício se fosse apenas uma prática de uma narrativa contada por meio de imagens. Mas essa coisa de entender a linguagem das fotonovelas me parece muito dispensável e irritante. E as aulas são uma tortura psicológica já que o professor fala dos conceitos como se estivesse cantando um mantra, resistir ao sono é tarefa duríssima, sorte que foram poucas aulas teóricas e mais práticas.
Outra novidade foi que corríamos o risco de receber mais uma daquelas visitinhas tenebrosas de um furacão, mas que, felizmente, passou longe. O furacão Paloma se dirigiu diretamente para o centro da ilha e ficou bem longe de nosotros. Torço pelo pessoal de Camaguey agora, porque parece que vão pegar um categoria 4 por lá. Quando o Ike passou por aqui, uns três dias antes já ventava muito forte, se escutava os uivos altos por toda noite. Mas o Paloma tem previsão de chegada para domingo de manhã e até agora nada. Está tudo muito calmo por aqui, então acho que ele não vai fazer nem cócegas na escola, felizmente.
E outra notícia chocante: vi dois filmes essa semana! Parece horrível para um estudante de cinema, certo? E é mesmo, mas não sei o que aconteceu. E justo nessa semana, onde eu – pasmem! - não tive atividade nas noites. Tive todas as noites da semana livres e só consegui ver dois filmes. E com um deles sofri muito para chegar ao final. Os contemplados foram:
A Conversação (Francis Ford Coppola) – Filme que narra de maneira interessantíssima o trabalho de um detetive particular que grava uma conversa de um homem e uma mulher a pedido do marido da mesma. Temendo pela vida dos dois gravados, já que percebe que o homem que o contratou pode tentar matar o casal, ele se depara com um dilema ético. Excelente performance de Gene Hackman como o detetive e brilhante roteiro.
Inland Empire (David Lynch) – Num futuro próximo me lembrem de dar mais uma chance a esse filme. Acho que David Lynch merece, mas, dessa vez, tenho que confessar que não me agradou. E não foi o fato de que este último ser completamente ininteligível. Até meados dos primeiros noventa minutos eu estava totalmente concentrado na obra, até achei bastante perturbador e bizarro. Mas depois da primeira hora e meia foi praticamente impossível resistir ao sono. Tive que terminar o filme numa segunda sessão, coisa que raramente faço. Destaque para o trabalho fenomenal de Laura Dern, atriz que parece só funcionar bem com Lynch.