
Embora não seja dos maiores fãs de documentários, tinha ouvido muitas críticas positivas desse filme e resolvi conferir. Não me arrependi nem um pouco, como, aliás, costuma acontecer quando eu cedo e vejo documentários. Na Captura dos Friedmans narra a história da destruição de uma família após as acusações de abuso sexual do pai e do filho mais novo.
Assuntos como a pedofilia sempre trazem à tona aquele sentimento de asco e revolta, e filmes que o abordam tendem a ser maltratados pelo público se não assumem a versão mais senso comum da coisa toda. Bem, Na Captura dos Friedmans não assume a posição mais comum, mas também está longe de fazer apologia ao crime. O principal acusado, Arnold Friedman, que na época das filmagens já estava morto, é focado no filme com distância crítica e uma certa ironia. A idéia que ele e seus filhos tinham de que todas as acusações não passavam de uma conspiração diabólica da polícia, é tratada com o devido ceticismo pelo diretor. Mas ainda assim ele não se furta de analisar o caso com rigor e descobre que muitas das acusações eram, se não falsas, altamente duvidosas.
O diretor Andrew Jarecki descortina um aspecto da sociedade ao voltar sua câmera para a família Friedman. E foi totalmente sem esforço que me lembrei imediatamente de Pecados Íntimos. Esse último filme parece encarnar de maneira ficcional o que o documentário de Jarecki encarna de maneira real. A sociedade cria uma histeria em torno de casos como esses justamente porque não quer pensar nos seus próprios ‘pecadinhos íntimos’.
Mas o aspecto mais marcante do filme todo é o relacionamento que a família Friedman estabelece com a imagem. São inúmeros registros filmados pelos filhos dos Friedmans e também por gerações mais antigas. Logo no início, David, o filho mais velho, aparece em um vídeo-diário, onde registra imediatamente que o caráter daquela filmagem era unicamente pessoal, não visava a exibição para outras pessoas. Portanto, a intimidade de uma família sendo exposta dessa maneira parece ser o aspecto mais chocante do documentário. David não desiste de filmar nem nas constantes brigas que a família tinha, está tudo lá, registrado para sempre.
O diretor traça impressionantes considerações a esse respeito. Justamente quando se pensa que o cotidiano filmado de uma família poderia jogar luz sobre uma tragédia de proporções tão grandes, a obra demonstra que o caráter desgastado da imagem hoje em dia é quase nulo. Qual segurança alguém tem sobre sua imagem atualmente? Nenhuma, justamente porque tudo é sobre a imagem e não mais sobre as pessoas. Sobre os Friedmans, poderia se falar qualquer coisa, ou mostrar, mas a tragédia já os tinha engolido de tal maneira que ninguém mais acreditaria em nada, por melhor que fosse.
Quem garante que grandes partes do processo movido pelo estado contra a família não fossem baseados em uma investigação mal feita e incoerente (como o próprio filme parece querer mostrar em alguns momentos)? Mas do que adianta isso? Como bem fala uma das detetives envolvidas no caso, uma vez que alguém é colocado como suspeito de um caso como esse é o fim da sua vida, independente se é culpado ou não. Sua imagem estará eternamente indexada a isso, mesmo que ele não esteja.
A extensa filmagem da família é apenas a demonstração de que a imagem está lá para que esqueçamos do essencial. O próprio David diz em determinado momento do filme que filmou as últimas horas do irmão, antes dele ir para a cadeia cumprir sua pena, porque assim era mais fácil, filmando ele não precisava estar lá de fato, não precisava pensar naquilo. É como a pequena bailarina mostrada no documentário, morta durante a infância, irmã de Arnold Friedman, algo belo mas que foi perdido pra sempre. Só restou sua imagem.

3 comentários:
hi from greece
lefobserver.blogspot.com
Não conhecia esse aí...vou dar uma procurada agora. Mas, creio que deve ser difícil de encontrar,não?
Olha, ele é de 2006 ou 2005 se não me engano. E como foi indicado ao Oscar eu acredito que não deve ser muuuito difícil de char não.
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